3ª PARTE DA HISTÓRIA DA DANÇA
A DANÇA NO RENASCIMENTO
A dança inspirava a arte no
renascimento e nos séculos seguintes Edgar Degas - Exame de Dança
Nessa época, na França e na Itália a arte renasceu: um movimento
cultural, denominado de Renascimento na França e de Quattrocento na Itália foi
o responsável pelo desligamento da arte com a Igreja e pelo desenvolvimento de
uma sociedade que valorizava e arcava com os custos da arte. A burguesia, uma
classe de comerciantes que enriquecia facilmente, crescia aos poucos,
mostrando-se uma classe liberal e revolucionária. A Nobreza, por sua vez,
cultuava o comportamento refinado, buscando a "arte de viver com
elegância".
Nesse terreno extremamente fértil para o desenvolvimento e os estudos
das artes, o intercâmbio entre os dois países foi intenso, o que favoreceu
ainda mais e diversificou esses movimentos. A dança de corte assinalava uma
nova etapa: aquela dança metrificada que havia se separado das danças populares
se tornou uma dança erudita, onde os participantes tinham que saber, além da
métrica, os passos.
Com isso, surgem os profissionais e mestres, que estudavam as
possibilidades de expressão do corpo e conseqüentemente elevavam o nível
técnico das danças. É importante lembrar também que eram pessoas que dedicavam
muito mais de seu tempo para a dança do que aqueles que apenas dançavam por
diversão. Os professores eram pessoas altamente valorizadas nas cortes, sendo
convidados especiais em todas as festas e respeitados pelas famílias. Eles
chegavam a assumir o papel de pais e chefes de família nas apresentações das
noivas a suas futuras famílias, pois esses eventos eram feitos sob a forma de
um ballet mudo.
Edgar Degas - A Bailarina
de Quatorze Anos
Ainda nessa época, foram escritos os primeiros livros sobre
a dança. O primeiro deles teria sido "Il perfetto Ballerino", de
Rinaldo Rigoni, imprimido em Milão em 1468. Infelizmente, essa obra não existe
mais. O mais antigo livro sobre dança que temos atualmente é "L'art et
Instruction de bien danser...", editado por Michel Toulouze em Paris, de
1496 a 1501.
Das escrituras antigas, a que melhor nos retrata a dança do
Quattrocento é um manuscrito de Domenico da Piacenza, que está atualmente na
Biblioteca nacional de Paris. Ele retrata uma gramática do Movimento, baseada
em cinco elementos constituintes da dança: métrica, comportamento, memória,
percurso, aparência. É importante lembrar que esses termos não têm o mesmo
significado exato de hoje. Uma segunda parte desse manuscrito enumera os passos
fundamentais, dentre os quais temos os passos simples e duplos, a volta e a
meia-volta (que não eram em meia-ponta), os saltos, os battements de pés e as
mudanças de pés.
No cinquecento (séc. XVI), como poderíamos esperar, a
evolução rumo a uma técnica mais apurada prosseguiu. Dois autores foram
responsáveis por esse desenvolvimento: Cesare Negri e Marco Fabrizio Caroso. O
primeiro escreveu um tratado com cinqüenta e cinco regras técnicas, descrições
coreográficas e novos passos, como o trango (meia-ponta) e o salto da fiocco,
uma espécie de jeté que girava. Sua mais importante contribuição foi a
introdução do piedi in fuore, o início do en dehors. O segundo apresenta em seu
tratado a pirueta e passos que deram origem ao pas de bourré e ao coupé (fioro
e groppo, respectivamente). As obras que se seguiram apresentam 68 tipos de
passos com relevés.
OS GRANDES BALLETS DE CORTE
Figuras retratando a dança
de corte
As danças de corte eram executadas como
coreografias, sempre da mesma forma, e deviam ser aprendidas por todos os
nobres. Cada coreografia possuía um nome, como o Pas de Brébant e o Bransle
franceses, o Canário, a Chacona e a Passacale vindos da Espanha, e a Pavana, o
Pazzo mezzo e a Volta italianas. Essa última, a Volta, era considerada uma
dança imoral, porque os cavalheiros seguravam as damas proximamente de seus
corpos, giravam sobre si mesmos fazendo-as saltarem, numa espécie de carregada.
Com esse movimento, as longas saias levantavam-se e mostravam parte dos
tornozelos. Essa dança pode ser vista no filme "Elizabeth" que
concorreu ao Oscar em 1999, onde Cate Blanchet (Rainha Elizabeth) e Robert
Fiennes (Lorde Robert) executam os passos diante da corte boquiaberta!
Já os Ballets de Corte eram uma espécie de
teatro dançado, bastante comuns nos grandes acontecimentos. Para se entender
como era um Ballet de Corte basta-se imaginar uma peça de teatro com as danças
da época, que usava poesia para contar a história e que não era repetido muitas
vezes, no máximo 1 ou 2, e é por isso que não foram conservados como os
repertórios. Na realidade, possuíam cinco elementos constituintes: dança,
música, poesia, cenário e ação dramática.
Os Ballets de Corte surgiram na França, mas a
partir de 1600 se espalharam pelas cortes de toda a Europa. Na segunda metade
do século XVI uma grande quantidade de problemas na sucessão dos reis da
França, brigas e guerras entre as famílias dos nobres geraram a necessidade de
se reafirmar o poder real. O ballet se tornou, então, um meio privilegiado de
propaganda, e após a consolidação do reinado de Luís XIV, era dançado como uma
cerimônia de adulação ao Rei. Aliás, Luís XIV era um apaixonado pela dança. Praticou
desde pequeno, às vezes até preocupando os responsáveis por sua educação porque
ele não se interessava por mais nada. Incentivou a dança durante todo o seu
reinado, e não só compôs um ballet inteiro como participou como ator de muitos,
e, a título de curiosidade, preferia os papéis de "grotescos mal
vestidos" e de mulheres.
Desse modo, os ballets contavam desde fatos
políticos como uma vitória na guerra até romances. Infelizmente, não há sequer
resquícios de libretos que narrassem as histórias representadas. O que podemos
descrever é que as coreografias apresentavam figuras geométricas como círculos,
quadrados, triângulos e até letras, geralmente a letra do monograma do rei.
Para que essas formações fossem visíveis, as danças eram exibidas num nível
abaixo dos espectadores, numa forma parecida mas não semelhante à dos teatros
de arena ou dos estádios de futebol (bem menores, logicamente). É interessante
notar que a dança de corte utiliza como personagens elementos não humanos, até
Deuses das culturas grega e romana, que representam as pessoas da vida real.
Para ilustrar, descrevemos abaixo dois Balés muito importantes:
O primeiro Ballet de Corte que apresentava os
cinco elementos conjugados (dança, música, poesia, cenário e ação dramática)
foi feito em 1564, quando Carlos IX, influenciado por sua mãe, fez uma viagem
de propaganda pela França. Perto do feudo de seu rival, o duque de Guise, foi
representado um balé onde Júpiter, que representava o Rei, apaziguava as
desordens que os outros quatro astros (planetas, na realidade)
"aprontavam". O Ballet Comique de La Reine (Balé cômico da rainha)
foi um dos mais conhecidos, servindo de modelo para todos os que foram criados
depois. Ele foi apresentado em 1581, na ocasião do casamento do Duque de Joyeuse
com a irmã da rainha, e durou quase cinco horas. Nele havia seis entrées, e as
formas geométricas eram largamente utilizadas. Sua principal inovação foi o
final, onde todos os nobres entram num enorme baile, participando, assim, do
grand-finale da "história" contada.
LUÍS XV
O Rei Luís XIV, nesse Ballet, era diferenciado por fitas amarradas
nos braços. A dança começa, então, a retratar apenas a Antiguidade clássica
(greco-romana), tornando-se repetitiva, monótona e perdendo de vista os valores
em transformação da época. Somado a isso, a exigência por perfeição técnica de
Luís XIV faz com que surja uma arte rigorosa e artificial, na qual o gesto
tinha mais importância que a emoção que o produziu. Dessa forma, a expressão
individual foi recusada em favor de uma cultura perene, que continuasse sendo
lembrada e usufruída através dos tempos. Percebe-se que a dança nessa época se
aproxima perfeitamente dos ideais greco-romanos de perfeição estética e de
imortalidade.
Em 1661, primeiro ano de Luís XIV em poder oficial, ele fundou a
Academia Real de Dança, antes mesmo das Academias de Letras (1663) e de
Ciências (1666). A Academia Real de Dança tinha a função de preservar a dança e
a qualidade técnica. Nenhum ballet podia se apresentar na Corte ou fora dela
sem antes ser aprovado pelos acadêmicos. Todavia, a academia não foi totalmente
levada à sério nem mesmo pelos seus próprios membros, de forma que não cumpriu
sua missão e foi fechada em 1780.
CONTINUAREMOS COM A HISTÓRIA DA DANÇA
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