OS
BALLETS ROMÂNTICOS
Foi na época do romantismo que os Ballets de
Repertório se firmaram. O Romantismo foi um movimento artístico de valorização
do sentimento em detrimento da razão (como desejava o mestre Noverre) e no qual
a imaginação era deixada à solta, sem qualquer controle ou auto--censura. Dessa
forma, a dança que expressa algo, que mostra sentimento, cresce notoriamente,
sem deixar morrer o imenso desenvolvimento técnico que havia acontecido
anteriormente. No momento, o que se buscava através da técnica eram formas
expressivas, a poesia do corpo, a fluidez da dança e não o virtuosismo e a
beleza das formas. Esses novos ideais, baseados na "Igualdade, Liberdade e
Fraternidade" da Revolução Francesa, se afastam totalmente dos ideais
estéticos greco-romanos. Os artistas tendem a se inspirar no seu cotidiano, nas
suas emoções reais, e não na idealização da perfeição dos Deuses.
Uma das grandes inovações
da Era Romântica foi o surgimento da dança na ponta dos pés. Eis um bom exemplo
dos ideais românticos: houve um imenso desenvolvimento da técnica, mas os
objetivos desse desenvolvimento vão muito além da estética da forma: na ponta
dos pés, a bailarina se torna muito mais leve e expressiva, pelo menos aos
olhos do espectador. Com as pontas, surge a supremacia feminina no balé: os
bailarinos agora serviam de suporte, para apoiar e levantar as grandes
estrelas. Para isso, eles deviam ser fortes, e belos e expressivos para as
histórias de amor. A dança agora se torna mais sensual (para os padrões da
época): para equilibrar a bailarina na ponta, o partner deveria ampara-la com
seu corpo ou ao menos segura-la pela cintura.
Nesse clima, em 1832,
nasceu La Sylphide. Foi o primeiro ballet já coreografado para as pontas.
Retratava um dos tema preferidos do romantismo: o amor entre mortais e
espíritos, e inaugurava a imaginação sem fim, que tratava de temas cotidianos
somados a seres como ninfas, duendes, fadas e elfos. Os Deuses do Olimpo
(gregos e romanos) estavam quase esquecidos.
As roupas brancas e longas
das ninfas, quase sempre com fartas saias de tule com collants, acentuavam o
corpo das bailarinas, o que contribuiu para a sensualidade e para a necessidade
de se lapidar ainda mais a técnica, pois agora o corpo aparecia mais (as saias
de tule são um pouco transparentes) e não era mais tão disfarçado pela
roupagem.
Nesses mesmos moldes, o
ballet "Giselle" estreou em 1841, sendo remontado mais tarde pelo
menos duas vezes. Assim como La Sylphide, Giselle apresentava um 1º ato
realista, entre os camponeses, e o 2º ato mais fantástico. Ao invés das ninfas
apresentadas no primeiro ballet, no segundo ato de Giselle surgiram novos seres
imaginários, as Willis, que eram como ninfas más (*ver Giselle em Ballets de
Repertório).
Dos
grandes nomes da primeira metade do século XIX, La Sylphide lançou Maria
Taglioni, a mais perfeita bailarina romântica, harmoniosa, que parecia flutuar.
Giselle lançou Carlota Grisi, uma mulher com uma interessante história pessoal,
inspiradora do ballet: foi profundamente amada por Julius Perrot, o coreógrafo
do ballet, com quem viveu, e também foi musa inspiradora do Libretista dessa
obra, Theóphile de Gautier, que morreu balbuciando seu nome. A segunda
bailarina que estrelou Giselle foi Fanny Elssler, muito conhecida por seu
estilo forte e voluptuoso.
A DANÇA ESPALHA-SE PELA
EUROPA
O romantismo marca também a
queda da dança francesa. Nessa época, os grandes nomes, sejam coreógrafos ou
bailarinos, circulavam por toda a Europa, e principalmente por São Petersburgo
e Viena. Na Ópera de Paris nada de esplendoroso aconteceu, a não ser da criação
de Le Corsaire, de Mazilier, em 1856, e Coppélia, de Arthur Sait-Leon, em 1870.
As bailarinas italianas
espalhavam uma nova "moda": a dança mais acrobática, mais voluptuosa,
como a de Fanny Elssler. Na Rússia, a monarquia dos Czares incentivava e
investia na dança, como forma de mostrar seu poder e grandiosidade. Tal
situação atraiu talentos de toda a Europa, que fugiam do mercantilismo e da
conseqüente falta de investimento na dança. Dentre eles, estava Marius Petipa,
o homem que ergueu e tornou conhecida e respeitada a escola russa.
Primeiramente, ele treinou
os alunos russos para substituírem as estrelas estrangeiras contratadas para os
papéis principais das obras apresentadas. Logo, trabalhou em uma técnica
especialmente russa, criando uma escola e bailarinos reconhecidos por sua
técnica clássica em quase todo o mundo.
Além disso, Petipa foi o
criador da maior parte dos Ballets de Repertório preservados até hoje. São
eles: Dom Quixote, de 1869; La Bayadère, de 1877; A Bela Adormecida, de 1890; O
Lago dos Cisnes, de 1895; e Raymonda, de 1898. Além desses, Petipa remontou
grandes ballets já reconhecidos na época, como Giselle, em uma versão
especialmente russa. Era sua característica montar obras que fugiam um pouco do
espírito do romantismo - que a esta altura já estava em decadência - pois
recheava seus atos com números virtuosísticos que não tinham muito a ver com a
história que estava sendo contada. Esses números não se desviavam
suficientemente da obra para enfraquecê-la, mas tornavam os ballets de Petipa
ricos superespetáculos. Um bom exemplo dessas "interferências" dentro
do enredo do ballet é o Pas-de-deux do Pássaro Azul no último ato de A Bela
Adormecida. Além disso, seus ballets sempre agradavam ao público.
Petipa trabalhou com
diversos compositores como Drigo, Glazunov (Raymonda) e Minkus (La Bayadère),
mas a parceria mais brilhante foi com Tchaikóvsky, em A Bela Adormecida. Dois
anos após a morte do compositor, remontou O Lago dos Cisnes (que já havia
estreado anteriormente com outro coreógrafo, mas fracassou) em parceria com seu
assistente Lev Ivanov, não menos talentoso que o mestre e seu sucessor. O Lago
talvez seja a mais conhecida e mais admirada obra clássica representada
atualmente.
A
Partir de 1887, Petipa integrou a seu estilo as novidades vindas da Itália, sob
pena de sair de moda. Após essa data, seus ballets expressam a virtuosidade
formal italiana, e tramas um pouco mais simples. Por isso, foi criticado por
escolher os temas de suas obras não pelo valor, mas pelas possibilidades
cênicas que ofereciam. É verdade que o coreógrafo valorizava a técnica e as
formas, mas o abandono da poesia e da sensibilidade, como aconteceu no início
do século XVII, foi tão leve que se tornou insuficiente para tirar o brliho dos
grandes ballets que criou. Tão imenso é esse brilho, que esses ballets encantam
as platéias e influenciam bailarinos e coreógrafos até hoje, século XXI.
O NEOCLASSICISMO NA DANÇA
NIJINSKY Y PAVLOVA
A partir do início do
século XX, a influência do ballet russo se espalhou por toda a Europa. A grande
expansão da dança russa se dá com Diaghilev, um amante das artes que organizou
uma espécie de "grupo itinerante", que apresentava os ballets russos
por todo o mundo. Com Diaghilev trabalharam alguns dos maiores nomes do século
XX: Michel Fokine (coreógrafo de Les Sylphides), Anna Pavlova, Nijinsky (grande
bailarino e autor de peças como A Sagração da Primavera) e Balanchine (também
coreógrafo e fundador do New York City Ballet). Diaghilev acreditava que a
dança deveria ser o encontro de todas as artes, e por isso os cenários das
peças de seu grupo costumavam ter assinatura de grandes nomes, e as músicas
eram de autoria dos novos talentos como compositores, como Stravinsky. Isso
tudo sem contar com inovações como a valorização do corpo de baile, que então
deixou de apenas figurar, ganhando mais números e destaque.
Enfim, foi graças a
Diaghilev que a força da dança ressurgiu no ocidente, chamando a atenção do
público (porque suas peças eram sempre ricas ou polêmicas) e dos novos talentos
que surgiram a partir de então. Era uma nova dança: extremamente virtuosa, com
um toque de poesia, modernidade e inovação.
Nessa mesma época, um grupo sueco
causa grande polêmica. Interessados em romper com as tradições, em 1920 Rolf de
Maré e o coreógrafo Jean Börlin fundam um grupo cuja maioria provinha da Ópera
Real de Estocolmo. Os suecos passaram 5 anos espalhando sua polêmica na Europa,
participando da extraordinária criatividade de sua época e transformando o
ballet em uma arte contemporânea. Suas peças mais marcante foram La Création du
Monde, em 1923 e Relâche, em 1924, sendo que esta última foi a primeira peça de
ballet que utilizava cinema (o filme entre'acte, de René Clair). Sendo assim,
os suecos foram responsáveis pela introdução do cubismo no balé, utilizando até
um cenário de Picasso no ballet Icaro.
La Création du Monde
La Création du Monde
BalanchinerRelâche
Em
1925, não aguentando as pressões que sofriam, por problemas e contradições de
sua arte (a técnica acadêmica clássica ainda era utilizada, com toda a sua
rigidez, apesar de toda a maleabilidade de suas idéias, cenários e histórias) o
grupo se dissolveu.
Foi assim que a dança, ainda clássica,
incorporou os ideais modernos. Através desses grupos, das concepções
coreográficas de Balanchine, Fokine e Nijinsky, de bailarinas revolucionárias e
marcantes como Anna Pavlova. As primeiras décadas do século XX se dividiram,
assim, entre o brilhantismo acadêmico russo e as inovações dos grupos. TERMINA NO PRÓXIMO CAPÍTULO